MPF recomenda às Forças Armadas no Rio Grande do Sul que não façam manifestações em homenagem à ditadura militar
O Ministério Público Federal, por meio do procurador Regional dos Direitos do Cidadão Enrico Rodrigues de Freitas, expediu recomendação para que o Comando Militar do Sul, Comando do 5º Distrito Naval, Ala 3 da Força Aérea Brasileira em Canoas (essa recomendação em conjunto com o procurador da República em Canoas Cláudio Terre do Amaral) e Ala 4 da Força Aérea Brasileira em Santa Maria não realizem manifestações em homenagem à ditadura militar.
Em ação coordenada, que reúne Procuradorias da República em pelo menos 18 estados, o Ministério Público Federal também recomenda às unidades militares a adoção de providências para que seus subordinados sigam essa orientação, e que sejam adotadas medidas para identificação de eventuais atos e de seus participantes – com fins de aplicação de punições disciplinares, bem como, comunicação ao MPF para a adoção das providências cabíveis.
No entendimento do MPF, é dever do Estado Brasileiro não só reparar os danos sofridos por vítimas dos abusos estatais no período da ditadura, mas também de não infligir a elas novos sofrimentos, o que é certamente ocasionado por uma comemoração oficial do início de um regime que praticou graves violações aos direitos humanos, confirmadas, em 2014, pelos Comandos do Exército, da Marinha e da Aeronáutica.
Os regulamentos disciplinares do Exército, da Marinha e da Aeronáutica consideram transgressão que qualquer militar participe, fardado, de manifestações de natureza político-partidária. No caso da Marinha, é vedada a manifestação pública de seus integrantes sobre assuntos políticas e, no caso da Aeronáutica, é também proibido participar de discussão sobre política ou religião que possa causar desassossego. Para o MPF, comemorações em homenagem à ditadura militar violam os regulamentos e também podem constituir ato de improbidade administrativa, por atentarem contra os princípios da administração pública: moralidade, legalidade e lealdade às instituições. As punições previstas na lei de improbidade vão de demissão do serviço público a suspensão dos direitos políticos, além de multas.
O documento do MPF menciona as declarações do porta-voz da presidência da República, no último dia 25 de março, que confirmaram ordem presidencial para que o Ministério da Defesa faça “as comemorações devidas com relação a 31 de março de 1964, incluindo uma ordem do dia já aprovada pelo nosso presidente”. E ressalta que “a homenagem por servidores civis e militares, no exercício de suas funções, ao período histórico no qual houve supressão da democracia e dos direitos de reunião, liberdade de expressão e liberdade de imprensa viola a Constituição Federal, que consagra a democracia e a soberania popular”.
O MPF considera, na recomendação, além dos mandamentos impostos pela Constituição brasileira, uma série de tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, que determinam o respeito à democracia e consideram que é obrigação de qualquer governo defendê-la. Cita, ainda que a “A exigência de respeito à democracia em outros países do continente não é condizente com homenagens a período histórico de supressão da democracia no Brasil”, diz o texto do MPF.
A recomendação enumera também dispositivos constitucionais, conclusões da Comissão Nacional da Verdade (CNV) e sentenças da Corte Interamericana de Direitos Humanos em que foram reconhecidas as graves violações de direitos humanos da ditadura militar no Brasil. Entre os documentos citados, está o ofício do Ministério da Defesa de 19 de setembro de 2014, que reconheceu “a existência das lamentáveis violações de direitos humanos durante o regime militar” e registrou que os Comandos do Exército, da Marinha e da Aeronáutica não questionaram as conclusões da Comissão Nacional da Verdade (CNV), por não disporem de “elementos que sirvam de fundamento para contestar os atos formais de reconhecimento da responsabilidade do Estado brasileiro”.