Feminicídios caem 86% em julho e revertem acumulado do ano no RS
O Rio Grande do Sul obteve em julho uma dupla vitória na luta por igualdade e respeito às mulheres. Além de completar o terceiro mês consecutivo com redução nos feminicídios, o declínio foi tão expressivo que conseguiu reverter para queda o cenário de alta do acumulado do ano.
Enquanto julho de 2019 teve 14 mulheres assassinadas por razões de gênero no Estado, o total de vítimas no mês passado caiu 86%, para duas vítimas – o menor número para o mês em toda a série histórica, iniciada em 2012. Com essa retração profunda, a soma de feminicídios em 2020 chegou a 53, dois a menos (-4%) do que os 55 registrados no mesmo período do ano passado, interrompendo a tendência de alta que se verificou no primeiro semestre. Os dados integram os indicadores criminais apresentados na manhã desta quinta-feira (13/8) pelo governador Eduardo Leite e pelo vice-governador e secretário da Segurança Pública, Ranolfo Vieira Júnior, em videoconferência com a as chefias de vinculadas da pasta e jornalistas.
Além do feminicídio, todos os demais indicadores de violência contra a mulher fecharam em baixa, tanto no recorte mensal quanto no acumulado. Os estupros, por exemplo, caíram 33,6% na comparação de julho deste ano, 95 casos, contra os 143 registrados no mesmo mês em 2019. Em igual leitura, as lesões corporais reduziram de 1.364 para 1.155 (-15,3%), as ameaças, de 2.739 para 2.295 (-16,2%), e as tentativas de feminicídio ficaram estáveis, com 22 casos.
O paralelo de acumulados nos primeiros sete meses em 2019 e 2020 mostra que já são quase 3 mil ocorrências de ameaça a menos, passando de 21.952 para 19.200 (-12,5%). Nas lesões corporais, a redução supera mil casos, de 12.056 para 10.876 (-9,8%). A soma de tentativas de feminicídio caiu de 205 para 188 (-8,3%), e de estupros, de 929 para 920 (-1%).
Dados comprovam que, ao contrário das expectativas sobre possível aumento da violência contra a mulher em razão do distanciamento social imposto pela pandemia do novo coronavírus, todos os indicadores apresentaram redução justamente no período em que o isolamento passou a ser necessário. De outro lado, as maiores altas ocorreram em janeiro e fevereiro, exatamente os dois meses em que o Estado ainda não convivia com as restrições para prevenção à disseminação do vírus.
Conforme a diretora da Divisão de Proteção à Mulher (Dipam) da Polícia Civil, delegada Tatiana Bastos, o recorde na queda de feminicídios fica ainda mais relevante quando considerado o contexto da Covid-19. Ao contrário dos demais indicadores de violência contra a mulher, a eventual subnotificação gerada pelo isolamento em razão da pandemia é praticamente inexistente entre os assassinatos consumados por motivo de gênero. “Para tabulação de feminicídios, analisamos todas as ocorrências que versam sobre morte de sujeito passivo do sexo feminino, e não somente os classificados com esse tipo criminal. Dessa forma, a pandemia não interfere na precisão desse dado específico, que reflete as várias ações integradas que temos adotado”, explica a delegada, enfatizando a parceria com o Observatório da Violência contra a Mulher da Secretaria de Segurança Pública (SSP) nas análises de cada uma das ocorrências com mulheres vítimas.
Tatiana também destaca um aumento expressivo de denúncias de terceiros, como vizinhos e familiares, em todos os canais de comunicação, as quais a Polícia Civil procura atender em no máximo 48 horas. “Quanto mais rápido a informação chegar, mais chances temos de proteger a vítima e seus filhos. Ademais, temos realizado busca ativa de mulheres em suas residências, feito campanhas de prevenção para mobilizar a sociedade, intensificado as ações de repressão, como cumprimento de mandado de prisão e busca e apreensão de armas, além de priorizar a remessa dos procedimentos graves e de descumprimento de medidas protetivas de urgência ao Poder Judiciário”, acrescenta delegada.
A coordenadora estadual das Patrulhas Maria da Penha (PMPs) da Brigada Militar (BM), major Karine Pires Soares Brum, ressalta o trabalho articulado e integrado de todos os órgãos da rede de proteção à mulher, cada um dentro de suas atribuições, que tem impacto direto na redução dos indicadores. “A Brigada Militar incrementou as PMPs em 113% em relação a 2019, hoje com 98 municípios cobertos, e em 33% o número de visitas às vítimas, o que certamente contribuiu para essa sequência de três meses de queda dos indicadores. O trabalho de monitoramento dos agressores, de orientação e de acolhimento às vítimas permanece sendo o mote da atuação das patrulhas”, afirma.
Em março, as PMPs ampliaram de 46 para 84 o número de municípios atendidos no Rio Grande do Sul. No mês seguinte, o total subiu para 97 e, em julho, a cidade de Minas do Leão foi a 98ª a ganhar a cobertura do efetivo especialmente capacitado para o monitoramento das medidas protetivas de urgência requisitadas pela Polícia Civil e concedidas pelo Judiciário.
Comitê interinstitucional agrega ação em políticas públicas para proteção da mulher
A integração, que já é uma das três premissas do Programa RS Seguro, também foi consolidada como matriz da política pública de proteção às gaúchas com a criação do Comitê Interinstitucional de Enfrentamento à Violência contra a Mulher, lançado na última sexta-feira (7/8), quando se completaram 14 anos da Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006). Instituído por decreto assinado pelo governador Eduardo Leite, o comitê integra o mais amplo conjunto de medidas voltados ao tema na história do Rio Grande do Sul.
Inserido nas estratégias do Programa RS Seguro, a iniciativa transversal já nasce com uma tarefa estruturada, o Projeto Agregador, que reúne o trabalho dos três Poderes e 16 instituições das esferas municipal e estadual, além de nove secretarias de Estado. Do planejamento à execução de ações concretas, o objetivo central é fortalecer a rede de apoio às vítimas e promover entre os gaúchos uma mudança de cultura, que valorize a proteção da mulher na sociedade em todas as suas formas, tendo como premissa a atuação integrada.
O Projeto Agregador identificou os desafios a serem enfrentados e já propôs o desenvolvimento de 11 subprojetos. Destes, cinco foram priorizados para início imediato. O primeiro foi concretizado com a instituição do Comitê Interinstitucional. Os outros quatro estão voltados para:
1 – Monitoramento do agressor;
2 – Ações nas escolas;
3 – Informar, prevenir e proteger;
4 – Grupos reflexivos de gênero.
Essa nova política de enfrentamento à violência contra mulher assume um compromisso com a efetividade dos objetivos propostos ao estabelecer, desde seu início, um cronograma para preparação e implantação das entregas pactuadas. A maior parte se dará no prazo de um ano, até julho de 2021. No site da SSP há mais detalhes sobre cada uma das linhas de ação do Projeto Agregador.
Homicídios têm queda de 12% em julho e mantêm acumulado em baixa
Assim como as mortes por motivo de gênero, os demais tipos de assassinatos reduziram em julho, aprofundando a queda no acumulado de 2020. No mês, os homicídios no Estado baixaram 12,2%, de 148 no ano passado para 130, o menor total em julho desde 2008, quando houve 125 vítimas. No paralelo das somas a partir de janeiro, a queda é de 8,1%, com quase uma centena de vidas preservadas. Foram 1.134 homicídios no período em 2019, contra 1.042 neste ano, o menor total para o intervalo desde 2011, quando o número de vítimas foi de 1.031.
O foco territorial para combate ao crime nos municípios onde ele mais se faz presente, como é feito desde o lançamento do Programa RS Seguro, puxou a redução verificada. No ranking das dez maiores quedas de homicídio no Estado em número absolutos, nove ocorreram em cidades priorizadas pelo RS Seguro:
Gravataí completa dois meses consecutivos sem homicídios
Em Gravataí, os planos de ação traçados a partir da análise realizada nas reuniões da Gestão de Estatística em Segurança (GESeg) levaram a cidade a alcançar um cenário que não era visto há 18 anos. Além de liderar o ranking no número de vidas poupadas na comparação destes primeiros sete meses com igual período do ano anterior, o município completou em julho dois meses consecutivos sem nenhum homicídio. Em maio, o último caso foi no dia 23. Depois, só houve nova morte em 12 de agosto.
A última vez que a cidade havia encerrado um mês sem assassinatos havia sido em agosto de 2006, e a sequência de meses com o indicador zerado não acontecia desde março de 2003. Naquela época, a dinâmica de organizações criminosas ainda era bastante incipiente e Gravataí tinha uma população de 248,5 mil habitantes. Hoje, o número de habitantes cresceu 13%, para 281,5 mil moradores (IBGE), enquanto o número de homicídios acumula queda de 55% na comparação de janeiro a julho deste ano com igual período de 2019.
Conforme o delegado Eduardo Amaral, titular da Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) de Gravataí, o resultado reflete a integração adotada como premissa pelo RS Seguro, com trabalho conjunto da Polícia Civil com a Brigada Militar e a Guarda Municipal. “Através desse trabalho integrado conseguimos aprimorar o levantamento das organizações criminosas que atuam na cidade e identificar com maior rapidez autores de homicídios. Com a investigação mais qualificada, agilizamos as prisões e conseguimos manter esses indivíduos segregados por mais tempo, o que também contribui para redução dos índices”, detalha Amaral.
O delegado destaca ainda que, desde janeiro de 2019, só a DHPP já realizou mais de 200 prisões, neutralizando a ação de homicidas e envolvidos com organizações criminosas que, mais à frente, poderiam provocar novos crimes fatais. “Além da integração, essa ação de inteligência para antecipar cenários e qualificar as apurações é fundamental para o nível de controle que conseguimos”, acrescenta.
Em Porto Alegre, que também compõem o grupo de 23 municípios priorizados pelo RS Seguro, os homicídios mantêm tendência de redução. No acumulado desde janeiro, a capital soma o menor total de vítimas desde 2010. Foram 179 assassinatos contra 203 registrados no mesmo período em 2019 (-11,8%). Em julho, a cidade repetiu o cenário do ano passado, com 29 óbitos, também o menor número para o mês em 11 anos.
Em geral, ao contrário do que se verifica nos crimes contra o patrimônio, a variação dos homicídios no Estado está descolada da influência da Covid-19. De janeiro a março, período que só teve a presença da pandemia na última quinzena, houve redução no número de assassinatos. Em abril e maio, quando as restrições impostas para prevenir o contágio pelo novo coronavírus foram mais rigorosas, o indicador fechou com leve alta. Em junho e julho, esse tipo de crime voltou a cair. Ou seja, não há uma constância que indique impacto da pandemia, como ocorre entre os delitos patrimoniais, cujas reduções têm sido aprofundadas desde que as medidas para reduzir a circulação de pessoas foram adotadas.
Ataques a bancos têm queda recorde de 77% em julho
O trabalho de inteligência e estratégia policial, aliado ao menor movimento urbano em razão da pandemia da Covid-19, conseguiu frear para níveis inéditos um tipo de crime que até alguns anos atrás tinha presença quase diária no cotidiano dos gaúchos. Os ataques a banco apresentaram retração de 77,8% em julho na comparação com o mesmo mês em 2019, passando de nove casos, na soma de furtos e roubos, para apenas dois neste ano – é o menor total absoluto e a maior queda percentual para o período desde que a SSP iniciou a contagem separada desse tipo de delito, em 2012.
O recorde positivo se repete no cenário acumulado, com queda pela metade. Entre janeiro e julho, houve um total de 30 ocorrências no Estado, 55% menos que os 68 ataques a banco em igual período do ano passado, quando o número já havia sido o menor da série histórica, marca novamente batida.
De acordo com o subcomandante-geral da Brigada Militar (BM), coronel Vanius Santarosa, a repressão qualificada proporcionada pelas análises de inteligência, que permite um monitoramento constante para reagir e até antecipar a ação de criminosos, é o principal fator para o sucesso na quase eliminação de um dos crimes que mais aterrorizava moradores de municípios no interior do Estado. “Conhecidos como novo cangaço, os roubos a bancos em que quadrilhas sitiavam pequenas cidades foram priorizados nas ações de repressão a partir da implantação da Operação Angico, no segundo semestre de 2019. A ofensiva tem resultado em muitas prisões de criminosos que atuam nessa área e reflete nas estatísticas a ponto de, neste ano, termos apenas duas ocorrências envolvendo explosivos”, comenta Santarosa.
A Operação Angico está estruturada em três estratégias: fiscalização ativa para evitar desvios, furtos e roubos de explosivos; mobilizações focadas em prisões de assaltantes; e utilização de efetivo especializado com suporte da inteligência. Um exemplo da eficiência da metodologia aplicada pela operação pode ser visto em ação durante a semana passada, no município de Novo Barreiro, na Região Noroeste do RS. Cinco criminosos assaltaram uma agência bancária da cidade na tarde de 3 de agosto. Logo após o crime, o cerco rapidamente mobilizado na região prendeu dois dos assaltantes. Em menos de 24 horas, com apoio da Polícia Civil, do Batalhão Aéreo e do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope) da BM, os outros três foram detidos com armas, munições e dinheiro.
Roubos de veículos caem 27% em julho e somam o menor total da série histórica
Além dos ataques a banco, outros delitos contra o patrimônio continuam em franca descendência no Estado. Um destaque é o roubo de veículos, que em julho caiu ao menor total de ocorrências para o mês desde que a contabilização foi iniciada pela SSP, em 2002. Com a manutenção integral do trabalho das forças de segurança e a menor circulação de pessoas em razão da pandemia, foram registrados 632 roubos de veículos no sétimo mês deste ano, 27% menos do que os 867 de igual período em 2019.
Com isso, o acumulado desde janeiro também apresentou redução. Enquanto no ano passado a soma do início do ano até o fim de julho foi de 6.912 casos, em 2020 esse total caiu 20,6%, para 5.490 ocorrências, a menor marca desde 2003, quando foram contabilizados 5.029 roubos de veículo.
Ainda entre os delitos contra o patrimônio, houve retração em julho nos furtos de veículo (-34,6%), nos roubos (-37,3%) e nos furtos (-38,2%) em geral e nos ataques a comércio (-39,8%). Os roubos a transporte coletivo, somadas as ocorrências envolvendo passageiros e trabalhadores de ônibus e lotações, teve cinco casos a mais do que no mesmo mês de 2019, mas o acumulado desde janeiro ainda é 42,9% menor do que o número de registros em igual período do ano passado.
RS tem dois latrocínios a mais em julho, mas acumula queda de 7,1% no ano
Consequência mais grave dos crimes patrimoniais com uso de violência, os roubos com morte somaram duas ocorrências a mais em julho deste ano na comparação com o anterior. O número de casos em todo o Estado passou de três para cinco (66,7%), ainda a segunda menor marca para o mês desde 2009, com quatro ocorrências.
No acumulado entre janeiro e julho, porém, o total de 39 latrocínios segue 7,1% abaixo dos 42 registrados no mesmo período de 2019. A soma atual é também a menor desde 2009, que teve 33 ocorrências entre o primeiro e o sétimo mês do calendário.
• Clique aqui e acesse as tabelas completas estão na página de estatísticas do site da SSP.